Por Maria Lúcia Vinha (setembro de 2023)
Na escola primária, aprendi que a nossa cidade, Jacarezinho, no Paraná, se desenvolveu no entorno do Ribeirão Ourinho e que foi justamente a fartura de água em nossa região o principal fator de motivação dos desbravadores vindos de outros estados do país a se instalarem por aqui.
Jacarezinho foi fundada em 1900, portanto tem pouco mais de 123 anos, embora sua colonização tenha sido iniciada na década de 1880.
Fui aprender, bem depois, que nessa época, a região era habitada pelos seus verdadeiros pioneiros, os indígenas, que à semelhança da colonização do Brasil, foram suprimidos da história oficial. Além disso, quando lembrados, muitas vezes, eram chamados pejorativamente de bugres.
Embora invisibilizados nos registros oficiais, é bem provável que os indígenas, povos originários dessa região, tenham vivido ao redor do Ribeirão Ourinho e em sintonia com ele.
O Ribeirão Ourinho tem um trajeto de aproximadamente 20 Km no nosso município. Sua nascente fica no bairro próximo ao antigo Clube dos Papagaios. Seu leito vai se avolumando com outras nascentes e assim ele chega no Rio Fartura que deságua no Rio Paranapanema, que despeja no Rio Paraná e, fazendo parte da Bacia do Prata, vai a Buenos Aires e encontra o Mar, próximo a Montevideo, na foz do Prata.
Esse ribeirão vai longe! De Jacarezinho para o mundo!
E não é só ele. O “Riacho do Navio”, cantado por Luiz Gonzaga, também vai bater no meio do mar.
Além de canções, as fotografias também nos transportam para cenários, mesmo aqueles que nunca visitamos. No caso do Ribeirão Ourinho, há poucos registros fotográficos antigos, mas em uma foto de 1950 do acervo de Celso Rossi, é possível visualizar a família Garrido curtindo as águas limpas do ribeirão nas proximidades da Vila Ageu.
Como nem tudo são flores, em dado momento, com a expansão da cidade no entorno do ribeirão, começaram a surgir problemas que o afetaram diretamente, desde a construção irregular de casas em suas margens, escoamento de esgoto clandestino em seu leito, além do arremesso de vários tipos de lixo.
Não bastassem esses problemas, o ribeirão se viu taxado como foco da doença Malária. É que às margens de seu curso de águas rasas era possível o desenvolvimento de mosquitos e através da picada da fêmea do mosquito Anopheles, infectada pelo microrganismo Plasmodium, ocorreria a transmissão dessa doença infecciosa.
Assim, começaram a denominá-lo de Rio da Malária! É triste, mas foi isso que ocorreu, tanto é que muitas pessoas, residentes do município o chamam por esse nome, até hoje.
Até o Jornal Folha de Londrina, em reportagem de 29/3/1998, intitulada ‘Chuva deixa desabrigados em Jacarezinho’, coloca, em determinado trecho: “Uma forte chuva que caiu ontem no final da tarde, em Jacarezinho, trouxe o caos para alguns bairros da cidade. Os rios da Malária e da Água Feia provocaram o alagamento de diversas casas”.
De Ourinho para Malária! O Ribeirão não merecia isso!
Com o passar do tempo, a correnteza do ribeirão, mesmo que suavemente, tem levado embora, de alguma forma, a associação do seu nome com a malária. Isso se deve à mudança de postura da comunidade jacarezinhense que procura valorizar a existência dessa riqueza que temos aqui junto a nós, o que compreende tomada de atitudes para sua revitalização.
E assim, em 22/12/2017, o mesmo Jornal Folha de Londrina, publica a reportagem ‘População unida para revitalizar o Ribeirão Ourinho’. Já no título se nota o retorno do seu nome à sua origem. Na sequência são apresentadas as intenções do grupo que estava à frente das iniciativas para sua revitalização e que tomaram corpo a partir da campanha da Fraternidade de 2017 com foco nos biomas brasileiros.
Na atualidade, as ações de cuidados com o Ribeirão Ourinho continuam, ele resiste e segue sua trajetória, de forma que se poderia dizer: Aguenta firme, viu?
Assim, se tivesse que mudar o seu nome, seria para ‘Ribeirão Resitência’.